quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Reportagens proibidas: Decisão do TJDFT 'não pode partir para censura prévia', diz ministro do Supremo

G1

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello afirmou nesta terça-feira (4) estar "preocupado” com a decisão adotada na última sexta-feira (31) pelo desembargador Dácio Vieira,do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), que proibiu o jornal “Estado de S. Paulo” de publicar informações sigilosas do inquérito da Operação Boi Barrica.

A ação da Polícia Federal investiga Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Para Mello, a decisão não pode servir de precedente para limitar a atuação da imprensa. “Me preocupa, porque, na minha compreensão pessoal, esse fato (a decisão do TJDFT) não pode ser ponto de partida para brecar a liberdade de imprensa”, argumenta Mello.

O magistrado também falou da suposta censura prévia e lembrou que a Constituição já prevê mecanismos, como ações cível e penal, para coibir abusos em reportagens publicadas pela imprensa. “O que me preocupa é parti-se para censura prévia, quando a Constituição prevê algo diverso. Caberia nesse caso ação cível ou penal por dano moral contra o jornal, caso houvesse extravasamento”, analisou Mello.

No dia 31 de julho, o desembargador do TJDFT concedeu liminar estipulando multa de R$ 150 mil para cada reportagem publicada pelo jornal sobre a Operação Boi Barrica. Para evitar “lesão grave e de difícil reparação” a Fernando Sarney, o desembargador determinou que o jornal se abstivesse “quanto à utilização (de qualquer forma, direta ou indireta) ou publicação dos dados relativos ao agravante (Fernando Sarney)”.

Vieira atendeu ao pedido formulado pelos advogados do filho do presidente do Senado. Os defensores argumentam que o vazamento de informações sigilosas do inquérito pode “causar prejuízo incalculável à honra” de Fernando Sarney.

A medida foi criticada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que a classificou como “censura prévia”. A Associação Nacional de Jornais (ANJ) também condenou “veementemente” a decisão. Na tarde desta segunda-feira (3), no entanto, Fernando Sarney divulgou nota afirmando que sempre defendeu a liberdade de imprensa e a livre manifestação de opinião.

O filho do presidente do Senado lamentou que a decisão judicial esteja sendo apresentada como "forma de censura à imprensa" e que isso é uma tentativa de "distorcer os fatos". Segundo o empresário, ele recorreu à Justiça contra o que considera "uma injustiça e uma violência" contra ele e a sua família.

Ainda segundo o ministro do STF, Marco Aurélio Mello, a liminar obtida pelos advogados de Fernando Sarney merece cautela porque ainda pode ser julgado no próprio STF. “O ato desencadeará remédio jurídico. Precisamos aguardar. Não estou censurando o beneficiado (Fernando), mas nós do Judiciário defendendo o direito às liberdades”, justificou Mello.

Jornal vai recorrer

O advogado do jornal, Manoel Alceu, deve ingressar com recurso tentando anular a decisão. A medida será apresentada ao próprio desembargador que analisou o caso. “Entre quarta e quinta-feira tomaremos providências junto ao próprio relator (Dácio) e a depender da reação dele eu tomarei outras providências”, disse Alceu, que não revelou maiores detalhes para não atrapalhar a estratégia da defesa.

Também em nota, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), afirmou nesta segunda não ter responsabilidade sobre a decisão judicial. “Não fui consultado sobre essa iniciativa, de exclusiva responsabilidade dele e de seus advogados, e por isso é uma distorção de má fé querer me responsabilizar pelo fato”, diz.

Sarney afirmou que seu filho era vítima de uma campanha “cruel e violenta” por parte do jornal “Estado de São Paulo”. Sarney disse que nunca processou nenhum jornalista. “Todo o Brasil é testemunha de minha tolerância e minha posição a respeito da liberade de imprensa, nunca tendo processado jornalista algum”, afirmou.

O líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), entrou com uma denúncia no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra o desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), que concedeu a liminar pedida pelos advogados de Fernando Sarney.

A aassessoria do desembargador Dácio Vieira, mas foi informado que o magistrado não iria comentar os fatos relacionados à decisão adotada por ele.

Operação Boi Barrica

No dia 22 de julho, na reportagem “Gravação liga Sarney a atos secretos”, o jornal revelou o teor de diálogos gravados durante a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal. As gravações mostram o empresário Fernando Sarney conversando com o pai sobre a nomeação de um suposto namorado de sua filha no Senado.

Na sequência de sete diálogos, além do filho de Sarney e do próprio presidente do Senado, também aparece a neta de Sarney.

A Operação Boi Barrica investiga as atividades empresariais de Fernando Sarney. Foi a partir do monitoramento das ligações telefônicas do empresário que os agentes gravaram as conversas com o presidente do Senado.

Selzy Quinta

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