Victor Hugo Lopes
O sociólogo francês Pierre Bourdieu diz que o princípio básico da seleção de notícias pelos jornalistas é a busca do sensacional, do espetacular. A escolha de uma realidade particular é construída sob a égide das categorias de percepção que são próprias dos jornalistas. Decorre daí um elemento significativo do campo dos jornalistas, que se interessam pelo excepcional ou, pelo menos, pelo que é excepcional para eles. A percepção sobre o que muitas vezes pode ser banal estruturou toda uma corrente de produção dentro do jornalismo, batizada de new jornalism, que procurava em fatos cotidianos conteúdo para suas reportagens, escritas com técnicas narrativas.
O conjunto de experiências adquiridas e internalizadas no campo do jornalismo constrói um tipo de filtro muito particular na interpretação e reconstrução da realidade. Ainda que se tenha a objetividade como princípio fundamental, a representação do real passa por percepções subjetivas que alteram o fato conforme a perspectiva do observador.
A produção no jornalismo é coletiva. Depende de uma rede de profissionais para que um fato seja percebido na realidade e transformado em notícia. Uma redação é divida em várias categorias: repórteres, redatores, fotógrafos, diagramadores, subeditores, editores, chefe de reportagem, pauteiro, rádio-escuta, editor-chefe e editorialista, conforme definição de Isabel Travancas. Neste espaço social – o das redações – há possibilidade de que conflitos aflorem – interinstitucionais e intrainstitucionais.
Bourdieu reconhece que o mundo dos jornalistas é dividido por conflitos, concorrências e hostilidades. Ainda assim, argumenta que os produtos jornalísticos são mais homogêneos do que se pensa. O francês aponta ainda que ninguém lê jornais como jornalistas que, por sua vez, tendem a pensar que todos lêem jornais. Assim, indica que para saber o que se deve dizer é preciso saber aquilo que foi dito por outros; essa lógica é o que permeia a homogeneidade da produção jornalística e o que leva à uma representação da realidade mais ou menos equivalente.
Bourdieu identifica ainda que o jornalismo abriga uma forma de marxismo curto, que denuncia sem explicar ou esclarecer. As relações de força objetiva que constituem a estrutura do campo não é percebida pelos leitores nem pelos jornalistas; podem notar os efeitos, mas não o peso da instituição em que trabalham. A posição das instituições dentro do campo jornalístico e a dos profissionais dentro da instituição é o que pode permitir a compreensão do que um jornalista pode fazer ou produzir.
As disputas por poder dentro do campo jornalístico é o que motiva a concorrência com os outros veículos e jornalistas; essa relação tensão é o que define sua posição no campo e suas estratégias de manutenção. Bourdieu explica que para ampliar o público é necessário que um veículo de imprensa perca suas asperezas, tudo o que pode dividir ou excluir. Para o autor, “constrói-se o objeto de acordo com as categorias de percepção do receptor”.
O monopólio sobre os meios de difusão implicam aos jornalistas uma forma de dominação: a de se exprimir em público, o que por vezes traz notoriedade. Bourdieu ainda aponta que o campo jornalístico – a exemplo de outros campos – traz pressupostos que estão inscritos em categorias de pensamento e que levam a seleção temática feita pelos jornalistas a operar na realidade social e nas produções simbólicas. Pode se pensar na notícia como o prêmio do campo jornalístico, em que os jornalistas reivindicam para si a capacidade de determinar o que é ou não importante para a coletividade.
Victor Hugo Lopes é jornalista e professor da Universidade Católica de Goiás
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