quarta-feira, 20 de maio de 2009

Opinião - Imprensa e poder: povo marcado, povo feliz

POR: Nile William Fernandes Hamdy

Nesta última semana, Goiânia sediou o 5º Congresso Nacional de Execução de Penas e Medidas Alternativas, com a presença de várias autoridades, como o ministro da Justiça, Tarso Genro; o secretário nacional de Segurança Pública, Romeu Tuma Júnior; e o secretário especial de Direitos Humanos, Paulo de Tarso Vanucchi. Dentre os temas e debates realizados pelos congressistas, houvera o tema Mídia, segurança pública e penas alternativas.
O referido debate travou com excelente precisão o poder que a imprensa nacional exerce sobre a Justiça e a magistratura, a espetacularização do crime e da marginalidade, assim como as interferências que vêm ocorrendo na legislação penal brasileira e nas políticas de Segurança Pública devido ao clamor que se provoca na opinião pública.
Um ponto polêmico e debatido, e que tem grande apoio da mídia nacional, é a implantação do sistema de liberdade vigiada através do monitoramento eletrônico de presidiários em progressão de regime ou liberdade condicional. Defendido ardorosamente por parcela significativa dos criminalistas que residem na Casa Grande, boa parte da imprensa nacional ressoa à população a necessidade de implantação deste sistema de invasão estatal do corpo humano e para isso alegam uma série de motivos, como a superpopulação carcerária e o alto custo de manutenção de um preso.
Entrementes, se observarmos que cerca de 30% dos presos do País poderiam estar em liberdade, não haveria no País superpopulação carcerária, já que este número de presos coincide com o déficit de vagas que está na ordem de 130.000 mil encarcerados. Ou seja, libertando 130.000 brasileiros que deveriam já estar livres não haveria déficit – lamentavelmente falta vontade política na reestruturação do Judiciário. Outro aspecto infame tão espalhado por governantes, parlamentares e por parte da imprensa é o alto custo dos presos. É fato que o Estado gasta cerca de R$ 1.300,00 (mil e trezentos reais) por prisioneiro ao mês, mas a maioria mal tem, no cárcere, papel higiênico, sabonete e creme dental: um conjunto de primeira necessidade que custa menos que quatro reais – com o histórico de corrupção que assola a credibilidade dos poderes, temos a impressão que parte dos administradores do sistema prisional deveria ser administrada por ele.
Nesse ambiente, temos o dado divulgado pelo blog do Ricardo Noblat em 16 de maio deste ano que o governo do sindicalista Lula já gastou em publicidade mais de R$ 6,3 bilhões – a manutenção do poder tem grandes custos, mas sempre pagos pelo povo. E nessa conta estão excluídos os gastos dos 26 governos de Estados, do governo do Distrito Federal e dos 5.563 municípios brasileiros. E a farra da autopromoção de governos não tem cor partidária, pois infelizmente, onde há poder, há sua necessidade de manutenção.
A velha máxima “quem paga a banda escolhe a música” parece ser muito verdadeira. Temos uma realidade social que é transmitida de forma que jamais contraria os interesses dos donos do poder. E infelizmente o domínio da imprensa é necessário para o domínio do povo. Basta vermos que na Bahia a família de Antônio Carlos Magalhães controla as retransmissoras das Organizações Globo assim como os principais jornais escritos daquele Estado; assim como a família de José Sarney domina aquelas e estes no seu Maranhão. Pobre povo, tão longe de Deus e tão perto de uma televisão.
A obscuridade no interior da imprensa brasileira, especialmente a televisiva, é tamanha. Qualquer grande empresa que tenha sócios é obrigada a publicar os balancetes de sua firma em jornais de grande circulação do Estado desta, exceto os veículos de imprensa. Como bom seria ver certas revistas, jornais e emissoras sendo obrigadas a divulgar o quanto recebem, o quanto gastam, quais seus doadores e em que épocas ocorrem generosas doações: afinal, se uma emissora de televisão é uma concessão pública, porque esconder do próprio povo, o outorgador da autorização, os valores que circulam por ela?
Foi defendido no debate que as empresas de Comunicação Social estivessem no mercado de ações das Bolsas de Valores. A credibilidade da informação precisa ser vinculada diretamente aos interesses financeiros, pois ninguém investiria em uma empresa que falseia na sua principal tarefa. Se uma fábrica de carros é envolvida numa denúncia sobre a fraude em alguma peça de seu veículo produzido, suas ações caem na Bolsa; logo, se uma matéria ou uma reportagem veiculada por uma empresa de comunicação é provada como inverídica, suas ações desvalorizariam e esta empresa teria prejuízos – este paralelo ilustra o controle social e o interesse financeiro como fiscais da comunicação.
Os meios de comunicação têm como precípua função a educação; e transmitir notícias é educar. Precisamos conhecer quais interesses estão ocultos quando é noticiado que é preciso construir presídios e invadir o corpo humano para preservar a segurança pública, se medidas tão simples como ter uma Justiça minimamente ágil e estruturada para evitar manutenção de prisões ilegais e apurar os caminhos das verbas públicas no sistema penitenciário poderiam ter sido tomadas. Infelizmente, muitos poderão ganhar muito dinheiro com a venda do medo, como no caso, com um sistema de monitoramento de pessoas por satélite – como já é feito com o gado bovino e com outros animais sob controle. Zé Ramalho ressoa perfeitamente em “ê ê ê  ô ô ô, vida de gado, povo marcado hei, povo feliz”...
Obviamente, um plano de educação e desenvolvimento para o País faz-se necessário, mas a curto prazo é necessário erradicar qualquer laço de promiscuidade que envolva os bastidores do poder. Não podemos admitir que paguemos para ser dominados, com tantas verbas públicas destinadas aos interesses privados: com os R$ 6,3 bilhões gastos só pelo governo federal dentre 2003 e 2008, poder-se-ia fazer tantas coisas no País... Lógico, sem corrupção.
Democratizar a imprensa para termos um povo habituado à cultura democrática – construímos um novo futuro, e saudamos veículos como o Diário da Manhã, que nos permite criticar a postura de alguns dos seus pares da imprensa.

Nile William Fernandes Hamdy
é estudante de Direito da UFG

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